sábado, 10 de novembro de 2007

Cristianismo e movimento - Atos 11:19-26


Desculpe-me os estudiosos, que com certeza terão mais propriedade do que eu para fazerem tais afirmações que pretendo aqui. Sei que essa tentativa de situar o surgimento do Cristianismo no mundo é deveras complicado e sempre controverso.

Porém, em minha humilde compreensão, gosto de pensar que o evento fundador do Cristianismo (refiro-me nesse texto ao cristianismo como um movimento baseado nos ensinos de Jesus, e não a instituição político-religiosa fundada por Constantino séculos mais tarde) foi narrado por Lucas nessas poucas linhas do livro de Atos: o surgimento da Igreja de Antioquia.

O nascimento dessa igreja marca de vez o próprio surgimento do Cristianismo. Sei que vários eventos anteriores, como por exemplo, a conversão e o batismo de Cornélio, são sinais de um movimento que possa ser chamado Cristão. Contudo, Antioquia seria o auge de tudo o que já estava acontecendo por intermédio do Espírito Santo sobre os discípulos.

Vejamos algumas informações dadas por Lucas que nos chamam a atenção:


1) Lucas associa o surgimento dos Cristãos ao evento anterior do Martírio de Estevão. Não desejo aqui afirmar que Estevão foi assassinado para que de alguma forma a igreja saísse de seu comodismo, e nem Lucas parece ter tal pretensão. O autor apenas expõe que esse evento ruim gerou uma benção maior para os discípulos, explicitando assim a capacidade de Deus de conduzir nossa história revertendo tragédias em oportunidades de abençoarmos e sermos abençoados. A grande migração missionária surgiu após o martírio de Estevão e fez com que o Evangelho saísse de seu casulo judaico e alcançasse assim outros povos. Entenda aqui o cristianismo como movimento, e não como instituição estática.

2) Apesar das mudanças geográficas, os discípulos não haviam ainda feito a sua “migração espiritual”. Eles saem de Jerusalém, mas o evangelho dentro deles ainda não é a mensagem universal Deus. Os seguidores do Nazareno estavam transformando-se numa seita com traços exclusivistas semelhantes ao dos seus perseguidores, os fariseus. A saída precisava ser não só do território de Jerusalém, mas também dos paradigmas limitadores que impomos à mensagem ilimitada de Jesus. Entenda aqui o cristianismo como mensagem universal, que quebra qualquer limitação. O verdadeiro cristianismo é sempre um movimento de morte (simbolizado em Estevão, uma figura do próprio Jesus) e partida (para fora do mundo convencional que criamos).

3) Os cipriotas e cireneus (var. Judeus Helenistas) são os que encarnam essa verdade universal do evangelho. Se não há entre nós pessoas inovadoras como esses helenistas, não há cristianismo verdadeiro. Se não há entre nós aqueles que conseguem enxergar que o horizonte que ainda não é o limite, então não há boa nova de Jesus na Igreja, por que esta é essencialmente universal. Ser um helenista é ser alguém que não só fala do evangelho a seus pares, mas que também consegue comunicar a mensagem de forma compreensível a cada cultura. O texto de Lucas diz que os helenistas anunciaram aos gregos (ou seja, os incircuncisos) a boa nova do “Senhor Jesus”. Se notarmos, eles não chamam Jesus de Cristo, mas de Senhor, que é uma característica messiânica mais compreensiva a mente grega. De tal forma, quando os discípulos são chamados de cristãos, significa dizer que "Cristo”, para os gentios, não era um título judaico, mas o nome próprio de Jesus. Sendo assim, o cristianismo não é só universal, mas também contextual.

4) A Igreja não é só resultado da ação de lideres, sacerdotes (alto clero), mas sua beleza está em ser um movimento que inclui a todos como agentes da anunciação da mensagem de reconciliação. Na história de Antioquia, os lideres mandaram um “avalista” quando a Igreja gentílica já havia tomado uma visibilidade notável. Quem fez a Igreja e o Cristianismo foram os leigos, aqueles que tiveram apenas a iniciativa, independente de títulos ou honras. Lucas não descreve a visita de nenhum grande apóstolo, uma figura notável, ou coisa do tipo; apenas revela que praticamente dois pequenos obreiros (Barnabé e Paulo) cresceram junto com a Igreja através da exortação e do ensino, de tal forma que foram capacitados para serem apóstolos para o mundo que ainda não conhecia a mensagem de Jesus. O cristianismo não é só um movimento expansivo, universal, revolucionário, contextual, mas também inclusivo.


Isso é a essência do verdadeiro Cristianismo, um movimento que é verdadeiro filho do Evangelho, que rompe os paradigmas impostos, que não se enclausura ou se embriaga com o poder. Um movimento onde tudo começa apenas da iniciativa do coração, inclusive dos pequenos, dos leigos, onde não há imposição hierárquica, mas as lideranças são forjadas no viver em comunidade. Leigos que falam da mensagem de forma que seu irmão compreenda na sua cultura. Um movimento do serviço com prontidão de coração.

Esse é o cristianismo primitivo, e qualquer dessemelhança com o cristianismo moderno, infelizmente, não é mera coincidência ou produto do acaso.

Um comentário:

Anônimo disse...

Alguma coisa esta mal contada nesta história. Em vez de perseguir os lideres, as perseguições eram feitas ao povão. Tinham, supostamente, autoridade para aterrorizar os que ninguem sabe quem eram, enquanto isto nada poderiam fazer com os lideres. Sabe de uma coisa? Isto tudo não passa de ficção literaria.